A vereadora Edna Sampaio, como algumas pessoas sabem, é engajada em inúmeras questões sociais, bem como na luta contra o racismo e o machismo. Ela que é a única parlamentar negra da história política de Cuiabá, talvez seja a prova viva de um racismo, que como ela mesmo disse, é estrutural.
Esse fato me chamou a atenção (tanto que quis me aprofundar um pouco mais no assunto) e tomei conhecimento de que no Brasil o Congresso Nacional é composto por apenas 2% de mulheres negras e elas são menos de 1% nas Câmaras dos Deputados, de acordo com uma pesquisa recente do IBGE.
Fiz questão de ir até o seu gabinete na Câmara de Vereadores de Cuiabá e lá tivemos uma conversa um tanto quanto agradável, em uma sala onde estavam presentes, além dela, alguns de seus colaboradores, que atuam diretamente com a vereadora.
E o que me deixou impressionada (no melhor sentido da palavra), foi o fato de que as pessoas que trabalham com ela, são pessoas que fazem parte dessa minoria. Haviam pessoas negras e do grupo LGBTQIA+. O que só prova que Edna é de fato um ser humano que se preocupa com essas causas.
Perfil da pessoa Edna Sampaio:
- Nome: Edna Luzia Almeida Sampaio
- Data de nascimento: 24/02/1967
- Profissão: Professora e gestora governamental
- Gosta do seu café: Amargo e com as notícias do dia
- Um livro favorito: Olhos D’água, da escritora e poetisa negra, Conceição Evaristo
A luta contra o racismo e o machismo estrutural
Ethiene: A que você acha que deve ao fato de ser a única parlamentar negra na história da política aqui de Cuiabá?
Edna: Está relacionado ao racismo estrutural.
Ethiene: Explica para nós o conceito de racismo estrutural.
Edna: Quando falamos em racismo, sempre se correlacionam ao fato de as pessoas praticarem injúria racial. Como por exemplo chamar o preto de macaco, dizer que o seu cabelo é ruim. Quando na verdade o racismo é uma estrutura de poder, que impede as pessoas pretas de chegarem ao poder.
Ethiene: Vamos trazer essa questão mais para dentro da política; qual a sua avaliação sobre o acolhimento das pessoas negras nesse âmbito. Na sua opinião, existe esse acolhimento no parlamento?
Edna: Os partidos políticos não estão organizados para acolher e nem para priorizar candidaturas negras.
Ethiene: E você consegue me dizer por que isso acontece, o porquê de não haver essa preocupação, por parte dos políticos em dar mais atenção à essa pauta?
Edna: Porque são pessoas que vêm de baixo, da periferia, do extrato social mais empobrecido, justamente por não terem tido oportunidades, devido a esse preconceito. E para a maioria dos políticos é mais viável que essas pessoas não cheguem ao poder.
Ethiene: Por que mais viável?
Edna: Porque uma vez essas pessoas chegando ao poder, elas têm a chance de confrontar essa política racista, criando leis para o fortalecimento dessa minoria. E aqui não estou apenas me referindo às mulheres negras, mas todos os grupos minoritários, que são alvos de preconceitos e têm seus corpos marginalizados. E isso pode não ser bom para essa política arcaica.
Ethiene: Você acha que esse racismo é velado, ou seja, as pessoas tentam disfarçar, para de repente manter uma “boa” relação com o colega de trabalho?
Edna: Sim, algumas pessoas até tentam disfarçar, porquê o racismo ou ele é de forma explícita ou velada, e isso se deve muito provavelmente por medo dessas pessoas sofrerem problemas judiciais. Porquê sabemos que o racismo é crime previsto por lei. Mas é nítido e está escrachado esse preconceito.
Ethiene: Você já foi vítima de preconceito por parte de outros vereadores, durante expedientes na Câmara?
Edna: Eu tenho sorte de ter chegado na política com uma idade um pouco mais avançada, ou seja, já venho de uma trajetória longa e de muitas lutas, o que me preparou para encarar essas situações e isso me ajuda a minimiza-las. Mas, mesmo assim, já me deparei com várias situações não só de racismo, como de machismo também.
Ethiene: Tem algum fato em especial que você possa contar?
Edna: Teve um caso emblemático que ocorreu com um vereador, que eu inclusive precisei fazer um boletim de ocorrência para entrar com um processo contra ele.
Ethiene: E por que isso aconteceu?
Edna: Aconteceu porque eu fui contrária é uma moção de aplausos à Teresa Cristina, então ministra da agricultura do ex-presidente Bolsonaro, moção apresentada por uma outra vereadora do PSDB. A minha justificativa foi o fato de que para mim a então ministra representava tudo que havia de pior no desenvolvimento da agricultura brasileira. Ela foi responsável pela importação de uma grande leva de veneno para o Brasil, que foi inclusive proibido em boa parte do mundo, veneno esse que foi responsável pela contaminação dos nossos rios. E o vereador em questão, que é bolsonarista, tomou isso como uma ofensa pessoal e disse que eu jamais poderia me colocar contrário aquele posicionamento e começou a gritar na Câmara, disse que eu não respeitava a outra mulher, disse também que eu sou uma pessoa odiosa, me comparou com uma famosa cantora que foi rechaçada no reality Big Brother , a Karol com K. Ou seja, ele usou uma prática muito recorrente, que é o julgamento generalizado de um corpo negro. Então para mim fica muito claro que nós não somos julgados por nós mesmos, e sim enquanto uma raça.
A vereadora Edna Sampaio nos fez as seguintes provocações:
- Quantas pessoas negras ocupam lugares de poder?
- E quantas têm poder de fala no âmbito político?
O Projeto Pessoas é idealizado por Vinicius Tarouco para o Café com Leitura e conta com a participação de profissionais dedicados da área de jornalismo, como Ethiene Portugal.
2 Comentários
Eu admiro muito essa mulher! Representatividade eu acredito ser a palavra que define bem o meu sentimento.
Incrível mesmo a entrevista da Edna e a reportagem realizada pela Ethiene. A forma de pensar dela é sensacional.