Escrito por: Vinicius “Veritas Volpe” Tarouco
Arte Por: Gabriel Gondran

O Diário Esquecido

Durante minhas pesquisas aqui na cidade, cheguei a um nome de uma Deusa africana, mais especificamente a Deusa do Mar. Seu nome na África é Janaína, mas já que os escravos não podiam ter religião e nem comentar sobre estes assuntos na frente de seus carrascos, eles a alteraram para Iemanjá aqui no Brasil; um nome que se mantém até hoje, inclusive na famosa “Festa de Iemanja” no Cassino. Por alguma razão, as pessoas entendidas do assunto recusavam-se a me oferecer suporte para o conhecimento de suas raízes africanas.

Mas com algum dinheiro, consegui persuadir alguns membros da biblioteca a me autorizar acesso a uma das salas restritas do arcaico edifício. Esta sala possuía, em seu canto mais protegido, o livro mais antigo do estado. Algo que nem a biblioteca da cidade vizinha de Pelotas sonhará em ter.

Mas o que mais me chamou a atenção foi um diário que encontrei naquela sala, intitulado “Diário de um comerciante inglês em busca de Iemanjá”. A língua escrita nas páginas daquele antigo livro eram uma mistura de africano, inglês e latim, compostas por um autor chamado John Luccock. Aparentemente um homem falido de negócios em sua cidade natal, na Inglaterra. Viera ao Brasil em busca de novos comércios. Aqui parece ter encontrado diversas riquezas, mas nenhuma se comparava aos artefatos antigos de uma Deusa… Iemanjá. Dizia ele, em garranchos escritos que, em sua caminhada matinal pela praia do Cassino, avistou uma linda duna, com flores em sua superfície. Narra ele que, ao se aproximar, sentiu um frio tão singular que parecia não pertencer ao Cassino. Uma anomalia no meio do nada. Percebeu que havia uma gruta, abaixo daquela duna. Isto era fantasticamente desconhecido e improvável, e fez com que o narrador daquele diário se perguntasse se estaria sonhando. Ao tentar entrar, um cachorro peculiar, que continha apenas três patas, começou a latir. John olhou para a vastidão e notou diversas pegadas mancas chegando até o lugar atual onde se encontrava aquele cão. Ignorando o animal aleijado, adentrou a profunda caverna, e com seu lampião a óleo, que carregara sempre consigo por ser um presente de um ente querido há anos falecido, se aventurou nas entranhas do escuro lugar, que parecia a boca do demônio, segundo ele. Indo mais a fundo,“se aproximando cada vez mais do inferno” como escrevera Luccock, encontrou diversos artefatos dos mais derivados: cálices de prata, escudos arcaicos banhados a ouro, ídolos das mais diversas crenças, muitas inclusive irreconhecível para o narrador deste antigo livro. Mas o que mais chamara a atenção do comerciante inglês, havia sido uma máscara. Tão incomum, brilhante, bonita e fascinante que Luckoc não demorou a ser atraído por ela como uma mariposa é atraída pela luz. Ao sentir a máscara em suas mãos, ouviu um grunhido sinistro, acompanhado por um forte cheiro de peixe que o estremeceu até a espinha. Ao apontar o lampião em direção ao som naquela fria caverna, conseguiu de relance ver uma figura humanoide sinistra. O rosto, apesar de parecer com o de um vulto humano, possuía algo nas extremidades laterais… como barbatanas. Ao soltar um grito, ao qual o autor se referiu como “constrangedor”, não demorou a segurar a máscara em uma das mãos e correr como se não houvesse um amanhã.

Eu estava começando a ficar estremecido com o que lera naquele livro, mas o pavor veio logo nas seguintes páginas, quando Luccock referiu-se a misteriosos desaparecimentos na praia do Cassino após retirar a máscara daquele sinistro covil abaixo da misteriosa duna. O que realmente me assombrou foi a maneira como ele descreveu os corpos pútrido encontrados na praia… todos eles da mesma maneira como o jornal Dunas refere-se nos dias atuais.

Luccock termina seu diário de maneira abrupta, dizendo que iria visitar uma última vez a desconhecida gruta, para devolver a máscara na esperança de que as misteriosas mortes na praia cessassem. Segundo minhas pesquisas, após este evento, nunca mais houve algum relato escrito sobre este comerciante, que agora reside como um personagem esquecido na história desta cidade.

A Duna do Guardião da Rainha do Mar continua na parte 3

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Por

Escritor, crítico e redator aficionado por livros e jogos eletrônicos. Conhecido como Veritas Volpe no ambiente artístico e literário.

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